LEI Nº 12.930, de 04 de fevereiro de 2004

 

Institui o marco regulatório dos programas de parcerias público-privada no âmbito do Estado de Santa Catarina, entre outras providências.

 

O GOVERNADOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA, em exercício,

Faço saber a todos os habitantes deste Estado que a Assembléia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

 

CAPÍTULO I

DO OBJETO E ÂMBITO DE APLICAÇÃO

 

Art. 1º Fica instituído o marco regulatório dos programas de parcerias público-privada no âmbito dos poderes do Estado de Santa Catarina.

 

Parágrafo único. Esta Lei se aplica a todos os órgãos da administração direta, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às demais entidades controladas direta ou indiretamente pelo Estado de Santa Catarina.

 

CAPÍTULO II

DO CONTRATO DE PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA

 

Seção I

Conceito e Princípios

 

Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se contrato de parceria público-privada o acordo firmado entre a administração pública e entes privados, que estabeleça vínculo jurídico para implantação ou gestão, no todo ou em parte, de serviços, empreendimentos e atividades de interesse público, em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem, ao partícipe privado, observadas as seguintes diretrizes:

 

I - eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade;

 

II - respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução;

 

III - indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional e do exercício de poder de polícia;

 

IV - responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias;

 

V - transparência dos procedimentos e das decisões;

 

VI - repartição dos riscos de acordo com a capacidade dos partícipes em gerenciá-los; e

 

VII - sustentabilidade financeira e vantagens sócio-econômicas do projeto de parceria.

 

Seção II

Do Objeto

 

Art. 3º Pode ser objeto de parceria público-privada:

 

I - a delegação, total ou parcial, da prestação ou exploração de serviço público, precedida ou não da execução de obra pública;

 

II - o desempenho de atividade de competência da administração pública, precedido ou não da execução de obra pública;

 

III - a execução de obra para a administração pública; e

 

IV - a execução de obra para sua alienação, locação ou arrendamento à administração pública.

 

§ 1º As modalidades contratuais previstas nesta Lei, bem como as demais modalidades de contratos previstas na legislação em vigor, poderão ser utilizadas individual, conjunta ou concomitantemente em um mesmo projeto de parceria público-privada, podendo submeter-se a um ou mais processos de licitação.

 

§ 2º Nas concessões e permissões de serviço público, a administração pública poderá oferecer ao parceiro privado contraprestação adicional à tarifa cobrada do usuário, como garantia de complementação de um faturamento mínimo estabelecido no contrato, ou, em casos justificados, arcar integralmente com sua remuneração.

 

§ 3º A administração pública também poderá estabelecer índices de faturamento máximo nas concessões e permissões de serviço público, caso em que os valores excedentes reverterão ao Tesouro Estadual a título de receita patrimonial.

 

§ 4º Nas hipóteses de execução de obra, ao término da parceria público-privada, a propriedade do bem móvel ou imóvel caberá à administração pública, independentemente de indenização, salvo disposição contratual em contrário.

 

Seção III

Das Regras Específicas

 

Art. 4º São cláusulas necessárias dos contratos de parceria público-privada:

 

I - prazo de vigência compatível com a amortização dos investimentos realizados, limitado a trinta anos;

 

II - as penalidades aplicáveis à administração pública e ao parceiro privado para a hipótese de inadimplemento das obrigações contratuais;

 

III - as hipóteses de extinção antes do advento do prazo contratual, bem como os critérios para o cálculo e pagamento das indenizações devidas; e

 

IV - o compartilhamento com a administração pública, nos termos previstos no contrato, dos ganhos econômicos decorrentes da alteração das condições de financiamento.

 

Seção IV

Da Remuneração

 

Art. 5º A contraprestação da administração pública nos contratos de parceria público-privada poderá ser feita por:

 

I - pagamento em dinheiro;

 

II - cessão de créditos não tributários;

 

III - outorga de direitos em face da administração pública;

 

IV - outorga de direitos sobre bens públicos; ou

 

V - outros meios admitidos em lei.

 

§ 1º A remuneração do parceiro privado poderá sofrer atualização periódica com base em fórmulas paramétricas, conforme previsto no edital de licitação.

 

§ 2º Os contratos previstos nesta Lei poderão prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho na execução do contrato, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade previamente definidos.

 

§ 3º A liberação dos recursos orçamentário-financeiros e os pagamentos efetuados para cumprimento do contrato com o parceiro privado terão precedência em relação às demais obrigações contratuais contraídas pela administração pública, excluídas aquelas existentes entre entes públicos e observado o disposto no art. 9º da Lei Complementar federal nº 101, de 4 de maio de 2000.

 

§ 4º Não se aplica à licitação destinada à contratação de que trata esta Lei, o disposto na alínea “a” do inciso XIV do art. 40 da Lei federal nº 8.666, de 21 de junho de l993.

 

Seção V

Das Garantias

 

Art. 6º Observadas a legislação pertinente e a responsabilidade fiscal, em particular, quando for o caso, o art. 40 da Lei Complementar federal nº 101, de 2000, fica a administração pública autorizada a conceder garantias para cumprimento de obrigações assumidas pelo parceiro privado em decorrência de contratos de parceria público-privada.

 

Art. 7º O contrato de parceria público-privada poderá prever que os empenhos relativos às contraprestações devidas pela administração pública possam ser liquidados em favor da instituição que financiou o projeto de parceria, como garantia do cumprimento das condições do financiamento.

 

Parágrafo único. O direito da instituição financeira limita-se à habilitação para receber diretamente o valor verificado pela administração pública na fase de liquidação, excluída sua legitimidade para impugná-lo.

 

Art. 8º Para o cumprimento das condições de pagamento originárias dos contratos administrativos decorrentes de parceria público-privada será admitida a vinculação de receitas e instituição ou utilização de fundos especiais, desde que previsto em lei específica.

 

Art. 9º Para concessão de garantia adicional ao cumprimento das obrigações assumidas pela administração pública, fica o Estado autorizado a integralizar recursos, na forma que dispuser ato do Poder Executivo, em Fundo Fiduciário de Incentivo às Parcerias Público-Privadas criado por instituição financeira.

 

§ 1º A integralização a que se refere o caput poderá ser realizada com os seguintes recursos públicos:

 

I - dotações consignadas no orçamento e créditos adicionais;

 

II - transferência de ativos não financeiros; e

 

III - transferência de bens móveis e imóveis, observado o disposto em lei.

 

§ 2º A integralização de recurso no Fundo Fiduciário mediante a transferência de ações de companhias estatais ou controladas pela administração pública, nos termos do inciso II do § 1º, não poderá acarretar a perda do controle acionário do Estado.

 

CAPÍTULO III

DA LICITAÇÃO

 

Art. 10. A contratação de parceria público-privada deve ser precedida de licitação na modalidade de concorrência, observado o seguinte:

 

I - o edital indicará expressamente a submissão da licitação e do contrato às normas desta Lei;

 

II - a concorrência será promovida no regime de pré-qualificação; e

 

III - no edital de licitação, poderá se exigir:

 

a) garantias de proposta e de execução de contrato superiores às estabelecidas na legislação em vigor, desde que compatível com o ônus decorrente do seu descumprimento;

 

b) que o licitante apresente promessa de financiamento, por empresas ou instituições financeiras que atendam aos requisitos de solidez e segurança definidos no edital;

 

c) como condição para celebração do contrato, que o licitante vencedor constitua sociedade de propósito específico para implantar ou gerir seu objeto, bem como a adoção de contabilidade e demonstração financeira padronizadas;

 

d) prever que o licitante vencedor deva ficar encarregado da elaboração do projeto pertinente ao objeto da licitação ou admitir a apresentação de projeto alternativo no procedimento licitatório;

 

e) facultar a adoção da arbitragem para solução dos conflitos decorrentes da execução do contrato.

 

Art. 11. A licitação, após a fase de pré-qualificação e desde que previsto no edital, observará os seguintes procedimentos:

 

I - a administração pública receberá propostas técnicas dos licitantes, podendo solicitar as adequações que reputar conveniente para atendimento do interesse público, até que as propostas sejam consideradas satisfatórias;

 

II - será fixado no edital prazo suficiente e razoável para atendimento das solicitações da administração;

 

III - encerrada a fase de adequação das propostas técnicas, a administração pública receberá as propostas de preço dos licitantes;

 

IV - os licitantes poderão apresentar novas e sucessivas propostas de preço até a proclamação do vencedor, nas condições e prazos previstos no edital;

 

V - o edital poderá limitar o direito de apresentação de novas e sucessivas propostas de preços aos licitantes que se situarem em intervalo definido no edital a partir da proposta inicialmente classificada em primeiro lugar; e

 

VI - não existindo pelo menos três propostas situadas no intervalo previsto no edital, os autores das três melhores propostas poderão oferecer novas e sucessivas propostas de preço.

 

Art. 12. Para julgamento das propostas, podem ser adotados os seguintes critérios:

 

I - menor valor de tarifa;

 

II - melhor técnica; e

 

III - menor contraprestação da administração pública.

 

§ 1º Os critérios de julgamento previstos neste artigo poderão ser combinados.

 

§ 2º A administração pública poderá adotar, como critério de desempate, demonstração da responsabilidade social dos licitantes.

 

CAPÍTULO IV

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

 

Art. 13. Ato do Poder Executivo instituirá órgão gestor, vinculado ao Gabinete do Governador, com a finalidade de fixar procedimentos para contratação de parcerias público-privadas no âmbito da administração pública e definir as atividades, obras ou serviços considerados prioritários para serem executados sob o regime de parceria, integrado pelos seguintes membros:

 

I - Secretário de Estado da Casa Civil;

 

II - Secretário de Estado da Fazenda;

 

III - Secretário de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão;

 

IV - Secretário de Estado da Infra-estrutura;

 

V - Secretário de Estado do Desenvolvimento Social, Urbano e Meio Ambiente;

 

VI - Procurador Geral do Estado;

 

VII - Consultor Geral do Estado; e

 

VIII - até três membros de livre escolha do Chefe do Poder Executivo.

 

Art. 14. A abertura de processo licitatório para contratar parceria público-privada está condicionada ao cumprimento das seguintes regras:

 

I - elaboração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada;

 

II - demonstração da origem dos recursos para seu custeio;

 

III - declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias; e

 

IV - avaliação e autorização do órgão gestor de que trata o art. 13.

 

§ 1º Para efeito do atendimento dos incisos I e II, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º da Lei Complementar federal nº 101, de 2000, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

 

§ 2º A comprovação referida no § 1º conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

 

§ 3º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 1º.

 

Art. 15. O órgão central de contabilidade do Estado editará normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de parcerias público-privadas.

 

CAPÍTULO V

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

 

Art. 16. Aplica-se às parcerias público-privadas o disposto na Lei federal nº 8.666, de 1993, e, no caso de concessões e permissões de serviços públicos, o disposto na Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e na Lei federal nº 9.074, de 7 de julho de 1995, no que não contrariar esta Lei.

 

Art. 17. A superveniência de lei federal instituindo normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada, no âmbito da administração pública, suspende a eficácia dos dispositivos incompatíveis contidos na presente Lei.

 

Art. 18. A presente Lei será regulamentada pelo Poder Executivo em até cento e oitenta dias após a sua promulgação.

 

Art. 19. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

Florianópolis, 04 de fevereiro de 2004

 

VOLNEI JOSÉ MORASTONI

Governador do Estado, em exercício