DECRETO Nº 1.764, DE 18 DE OUTUBRO DE 2018

 

Regulamenta a Lei nº 17.479, de 2018, que dispõe sobre a utilização das Areias Descartadas de Fundição (ADF).

 

O GOVERNADOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA, no uso das atribuições privativas que lhe conferem os incisos I e III do art. 71 da Constituição do Estado, conforme o disposto na Lei nº 17.479, de 15 de janeiro de 2018, e o que consta nos autos do processo nº SCC 0371/2018,

 

DECRETA:

 

Art. 1º Ficam estabelecidas as diretrizes para a autorização ambiental (AuA) de processos decorrentes da utilização das Areias Descartadas de Fundição (ADF) como insumo ou matéria-prima em outros processos industriais e obras, tais como:

 

I – produção de concreto asfáltico;

 

II – produção de concreto e argamassa para artefatos de concreto;

 

III – fabricação de telhas e tijolos;

 

IV – fabricação de artigos de barro cozido para objetos de cerâmica;

 

V – assentamento de tubulações e de artefatos para pavimentação;

 

VI – base, sub-base e reforço de subleito para a execução de estradas, rodovias e vias urbanas; e

 

VII – cobertura diária em aterro sanitário.

 

§ 1º Outros tipos de utilização não previstos no caput deste artigo deverão ser objeto de estudos técnicos específicos a serem apresentados ao órgão ambiental licenciador.

 

§ 2º As utilizações previstas no caput deste artigo dependerão de AuA específica, a ser conferida por órgão ambiental licenciador, conforme o disposto neste Decreto, cuja validade não poderá exceder o período da vigência da Licença Ambiental de Operação (LAO) ou da AuA do empreendimento ou atividade.

 

§ 3º A AuA de que trata este Decreto fica dispensada no caso de reutilização de resíduos pelo gerador, ou seja, quando utilizados em seu próprio processo produtivo ou planta fabril.

 

Art. 2º Para os efeitos deste Decreto, ficam assim definidos:

 

I – areia descartada de fundição: areia proveniente do processo produtivo da fabricação de peças fundidas, como areias de macharia, de moldagem, “areia a verde”, preta, despoeiramento, de varrição, entre outras areias que sejam classificadas conforme a ABNT NBR 10004 como classe II - não perigoso, livre de mistura como qualquer outro resíduo ou material estranho ao processo que altere suas características;

 

II – concreto asfáltico: mistura executada a quente, em usina apropriada, com características específicas, composta de agregado graduado, material de enchimento (filler), se necessário, e cimento asfáltico, espalhada e compactada a quente, conforme Norma DNIT 031/2004-ES - “Pavimentos flexíveis - Concreto asfáltico - Especificação de serviço”, do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes;

 

III – minimização dos resíduos gerados: redução, ao menor volume, quantidade e periculosidade possíveis, dos restos de materiais e substâncias provenientes do processo produtivo, antes de descartá-los no meio ambiente;

 

IV – recuperação: técnica que permite que constituintes de interesse, presentes em um resíduo sólido, tornem-se passíveis de utilização no próprio processo produtivo;

 

V – utilização: prática ou técnica na qual os resíduos podem ser usados na forma em que se encontram, sem necessidade de tratamento para alterar as suas características físico-químicas;

 

VI – artefato de concreto: material destinado a usos como enchimentos, contrapiso, calçadas e fabricação de artefatos, tais como blocos de vedação, meio-fio (guias), sarjetas, canaletas, mourões, placas de muro, lajotas ou pavimentos intertravados (paver);

 

VII – reforço do subleito: é a camada de espessura constante transversalmente e variável longitudinalmente, de acordo com o dimensionamento do pavimento, fazendo parte integrante deste e que, por circunstâncias técnico-econômicas, será executada sobre o subleito regularizado;

 

VIII – sub-base: camada de pavimentação, complementar à base e com as mesmas funções desta, executada sobre o subleito ou reforço do subleito devidamente compactado e regularizado (DNIT - ES 139/2010);

 

IX – base: camada de pavimentação destinada a resistir aos esforços verticais oriundos dos veículos, distribuindo-os adequadamente à camada subjacente, executada sobre a sub-base, o subleito ou o reforço do subleito devidamente regularizado e compactado (DNIT - ES 142/2010);

 

X – assentamento de tubulação: atividade na qual a tubulação é colocada com sua geratriz inferior coincidindo com o eixo do berço (camada de solo situada entre o fundo da vala e a geratriz inferior da tubulação), de modo que as bolsas fiquem nas escavações previamente preparadas, assegurando um apoio continuo do corpo do tubo (ABNT 7367);

 

XI – assentamento de artefatos para pavimentação: camada de base ou sub-base do pavimento destinada a resistir aos esforços verticais, assegurando apoio contínuo e ajuste na distribuição regular dos artefatos utilizados;

 

XII – cobertura diária de aterro: camada de material empregada na cobertura dos resíduos dispostos no aterro sanitário ao final da jornada de trabalho ou, caso necessário, em intervalos, para cumprimento das funções previstas em projeto (NBR 15702); e

 

XIII – artefatos de cerâmica vermelha: materiais com coloração avermelhada empregados na construção civil (tijolos, blocos, telhas, elementos vazados, lajes, tubos cerâmicos e argilas expandidas) e também em utensílios de uso doméstico e de adorno (ABC).

 

§ 1º As aplicações de que trata o inciso VI do caput deste artigo geralmente implicam o uso de concretos estruturais (ABNT 8953) e não estruturais, normatizados pela ABNT.

 

§ 2º A utilização de que trata o inciso VII do caput deste artigo tem por finalidade melhorar as qualidades do subleito e regularizar a espessura da sub-base (DNIT - ES 138/2010).

 

Art. 3º Os geradores dos resíduos deverão adotar os seguintes critérios, com o objetivo de propiciar a utilização de resíduos:

 

I – descrever as características técnicas das unidades do gerador, apresentando a descrição textual e o fluxograma do processo produtivo de origem;

 

II – caracterizar os resíduos a serem utilizados, apresentando os respectivos laudos técnicos de análise, incluindo as características físico-químicas e ecotoxicológicas, além de outras que sejam pertinentes à aplicação envolvida;

 

III – realizar a classificação do resíduo segundo a ABNT NBR 10004, observando que a coleta de amostra atende aos procedimentos da ABNT NBR 10007 e sendo que, caso ocorram alterações no processo produtivo deverá ser realizada nova classificação;

 

IV – Encaminhar a ADF não passível de uso para a disposição final ambientalmente adequada e apresentar o plano de gerenciamento de resíduos de acordo com a Lei federal nº 12.305, de 2 de agosto de 2010; e

 

V – Realizar teste de ecotoxicidade com a ADF classificada, observado, no que couber:

 

a) no caso do preparo do eluato para realização de teste de ecotoxicidade com os organismos Vibrio fischeri e Daphnia magna, deverá ser seguido o procedimento constante do Anexo Único deste Decreto, bem como as normas técnicas aplicáveis; e

 

b) poderão ser utilizados outros organismos normatizados para o teste de ecotoxicidade, desde que atendidas as normas técnicas aplicáveis e observadas as condições mínimas de preparo da amostra para realização dos ensaios.

 

§ 1º As análises devem ser realizadas por laboratórios reconhecidos pelo Instituto do Meio Ambiente (IMA) para os parâmetros de interesse ambiental que compõem o estudo.

 

§ 2º Para efeito da caracterização dos resíduos, deve ser considerado como ponto de amostragem o local de descarte final antes da destinação, sempre que provenientes de um mesmo processo e, no caso de processos diferentes, cada um deve ser caracterizado individualmente.

 

§ 3º A caracterização do lote dos resíduos deve ser realizada a cada 6 (seis) meses durante o primeiro ano, contada a partir da AuA e, após esse período, anualmente.

 

§ 4º Para efeitos de caracterização dos resíduos, a empresa geradora não poderá misturar diferentes tipos de resíduos nem outros materiais como forma de adequação às condições estabelecidas neste Decreto.

 

§ 5º Fica vedada a diluição e/ou descaracterização de resíduos.

 

Art. 4º Para obter a AuA para utilização da ADF, o responsável pelo empreendimento no qual a ADF será utilizada deverá fornecer ao órgão ambiental licenciador:

 

I – requerimento da AuA e confirmação de localização do empreendimento segundo suas coordenadas geográficas (latitude e longitude) ou planas (UTM);

 

II – cópia do comprovante de quitação da taxa de licenciamento ambiental;

 

III – cópia do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) ou do Cadastro de Pessoa Física (CPF);

 

IV – documento formal de Aceite e Recebimento entre a empresa geradora e a empresa destinadora final;

 

V – cópia da LAO vigente do gerador;

 

VI – cópia da LAO vigente do destinador final, quando aplicável;

 

VII – Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) ou de Função Técnica (AFT) dos profissionais habilitados para a elaboração do projeto no qual o resíduo será utilizado; e

 

VIII – no caso de uso da ADF como matéria-prima na fabricação de produtos, apresentar a descrição do processo de utilização, contendo no mínimo:

 

a) a descrição do processo de incorporação da ADF e obtenção do produto final, incluindo o fluxograma;

 

b) os dados obtidos do gerador quanto à caracterização, classificação dos resíduos e dados de ecotoxicidade;

 

c) os materiais envolvidos na fabricação do produto;

 

d) a porcentagem do resíduo a ser utilizado;

 

e) o volume de resíduo a ser utilizado;

 

f) o local e a forma de acondicionamento do resíduo no destinador final; e

 

g) outras informações técnicas consideradas relevantes para o projeto, respaldadas por estudos de instituições de pesquisa ou ensino independentes, se disponíveis.

 

Art. 5º O armazenamento temporário da ADF deverá atender às recomendações estabelecidas na NBR 15984, específica para essa atividade.

 

Art. 6º O controle de transporte da ADF deverá atender ao disposto na Lei nº 15.251, de 3 de agosto de 2010, sobre o Manifesto de Transporte de Resíduos (MTR).

 

Art. 7º Para ser utilizada, a ADF deverá apresentar as seguintes características:

 

I – ser classificada como resíduo classe II-A ou II-B, de acordo com a NBR 10004;

 

II – apresentar pH na faixa entre 5,5 e 10,0;

 

III – não apresentar toxicidade maior que Fator de Toxicidade (FT) 8 para aplicações de assentamento e recobrimento de tubulações e FT 16 para as demais aplicações; e

 

IV – atender às normas técnicas de projeto, execução e qualidade aplicáveis ao concreto asfáltico, artefatos de concreto e cerâmica, assentamento de tubulações e artefatos para pavimentação, base, sub-base e reforço de subleito para execução de estradas e rodovias, incluindo vias urbanas e cobertura diária em aterro sanitário.

 

Art. 8º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

 

Florianópolis, 18 de outubro de 2018.

 

EDUARDO PINHO MOREIRA

Governador do Estado

 

LUCIANO VELOSO LIMA

Secretário de Estado da Casa Civil

 

ADENILSO BIASUS

Secretário de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável

 

 

ANEXO ÚNICO

 

PROCEDIMENTO PARA PREPARO DE ELUIÇÃO DE AMOSTRAS DA ADF PARA TESTES DE ECOTOXICIDADE AGUDA

 

Procedimento para o ensaio com o organismo Vibrio fischeri1:

 

1. Homogeneizar bem a amostra de ADF.

 

2. Pesar 100 g (cem gramas) da amostra, transferir para um frasco de material atóxico com capacidade de 1000 mL e adicionar 400 mL de água deionizada ou destilada. Sempre manter a proporção de 1:4 entre a amostra e a água.

 

3. Tampar, vedar e agitar manualmente para desfazer possíveis torrões.

 

4. Promover agitação por 24 (vinte e quatro) horas à temperatura ambiente. A velocidade deve ser escolhida em função de garantir que todos os sólidos se mantenham em suspensão durante a agitação.

 

5. Após agitação, deixar os frascos em repouso, à temperatura ambiente, por 1 (uma) hora para separação das fases (sólido/líquido).

 

6. Transferir o sobrenadante restante para outro frasco atóxico (tubos tipo Falcon) e adicionar NaCl para atingir uma concentração final de 20g/L (obtendo-se uma solução salina para ensaios com Vibrio fischeri).

 

7. Homogeneizar em agitador de tubos por 5 (cinco) minutos e centrifugar em uma velocidade de 5000 g durante 10 (dez) minutos2.

 

8. Após a centrifugação, filtrar o sobrenadante com membrana de fibra de vidro (0,8 μm) e em seguida com membrana de acetato de celulose (0,45 μm).

 

9. Realizar o ensaio ecotoxicológico agudo do eluato filtrado com o organismo Vibrio fischeri segundo a ABNT NBR 15411-3.

 

Nota 1: no caso da realização do ensaio com o organismo Daphnia magna, a eluição das amostras deve ser realizada sem a adição de solução salina e o eluato testado segundo a ABNT NBR 12713.

 

Nota 2: algumas amostras necessitam de um tempo de decantação para que seja possível observar a separação de fases do sobrenadante após a centrifugação. Por isso podem permanecer decantando por até 16 (dezesseis) horas em refrigeração.